O homem que tem a missão de guiar a maior esperança do tênis brasileiro é argentino. Daniel Orsanic, 43 anos, foi anunciado em 30 de novembro como o novo técnico de Thomaz Bellucci. Em entrevista exclusiva ao Terra, ele destaca a receita de tranquilidade que usará no trabalho e descarta uma mudança drástica na atitude do jogador, cujo 2011 foi marcado pela instabilidade que o fez sofrer dez derrotas de virada.
Tranquilidade que segundo contou no Twitter um amigo, o ex-tenista Fernando Meligeni, é uma das características de Orsanic. Questionado se esse perfil, aparentemente próximo ao do recatado Bellucci, pode dar mais certo na comparação com o mais emotivo e explosivo Larri Passos, o argentino até concorda, mas ressalva: "sou um apaixonado também".
Com Larri, ex-técnico de Gustavo Kuerten, as expectativas eram grandes, mas Bellucci não conseguiu mais do que terminar como o número 37 do mundo a temporada que iniciou como o 31. Orsanic não quer nem ouvir a palavra ranking ao comentar os objetivos ao lado do novo pupilo e evita falar sobre o que mexerá no jogo do atleta. "Vamos agregar algumas coisas", repete.
O técnico não dá tantos detalhes mesmo porque confessa que necessita conhecer melhor o brasileiro. Em bom português, ele minimiza a rivalidade esportiva entre os países vizinhos. "Só brigamos no futebol", afirma ele, que é torcedor do River Plate e admite não saber qual é o time de coração de Bellucci (o Palmeiras). Eles realmente precisam de mais contato.
Na entrevista, Orsanic ainda ressalta que, diferentemente deste ano, Bellucci se inscreverá no ATP 250 de Buenos Aires, marcado para fevereiro. Grande parte dos treinamentos do jovem, 23 anos, será feita nessa cidade, havendo revezamento com São Paulo.
Na rotina do descendente de croatas não será mais possível acordar cedo para levar todos os dias o casal de filhos ao colégio, o que havia feito na última sexta imediatamente antes de atender o celular às 8h (de Buenos Aires) para uma conversa de 30 minutos com o Terra. Mas não se importa. "Meu filho está muito empolgado", exclama a mãe do argentino, Carolina. O tênis nacional espera que Bellucci também esteja.
Confira a entrevista exclusiva com o argentino Daniel Orsanic:
Terra - Percebo que você e o Bellucci não terão problemas de comunicação.
Daniel Orsanic - (Ri) O Thomaz entende muito bem espanhol e de português falo um pouco também. Mas eu disse para ele falar em português e eu em espanhol, assim aprendemos juntos.
Orsanic fala português razoavelmente bem. Ele jogou duplas constantemente no circuito profissional entre 1999 e 2001 com o brasileiro Jaime Oncins. A parceria foi semifinalista de Roland Garros em 2000
Terra - Como foi o contato inicial para treinar o brasileiro?
Daniel Orsanic - Falei com ele e com seu manager, o Roberto Marcher, por telefone. Terminei meu contrato com (Pablo) Cuevas em outubro e averiguaram se eu estava disponível. Depois viajei a São Paulo na semana passada (há duas semanas) para uma reunião.
Roberto Marcher é diretor técnico da Koch Tavares, empresa que gerencia a carreira do tenista brasileiro. Já Pablo Cuevas é um jogador uruguaio
Terra - Você já conhecia os dois?
Daniel Orsanic - O Roberto eu tinha visto em alguns torneios. O Thomaz eu conheço do circuito, de tê-lo visto jogar muitas vezes. É um jogador que eu gostava de ver, e agora tenho a possibilidade de trabalhar com ele, o verei mais de perto.
Terra - O convite para treinar o Bellucci chegou a surpreender?
Daniel Orsanic - Foi agradável a noticia de terem pensado em mim para treinar o Thomaz. Estou empolgado. Creio muito nele como jogador, sei que é uma boa pessoa pelos amigos que tem, pelos comentários que ouvi. Sou amigo de um ex-técnico dele, João Zwetsch (capitão do Brasil na Copa Davis). Tenho muitas boas referências em nível humano, isso para mim é muito importante também.
Terra - De longe, qual avaliação você faz do Bellucci? No Brasil, com as recentes viradas que ele vem sofrendo nas partidas, fica a impressão de que o maior problema dele para dar um salto no ranking é a parte mental e não a técnica.
Daniel Orsanic - Acho que fisicamente e tecnicamente o Thomaz é muito bom, senão não teria sido possível ganhar dois ATPs (250) como fez em Gstaad (em 2009) e Santiago (2010). Há vários jogadores muito bons tecnicamente que nunca chegam a ganhar um torneio ATP, por isso confio em seu jogo. Porém, também confio em sua estabilidade mental. Preciso conhecê-lo mais, mas não estou tão de acordo: ele também ganhou muitas partidas em que estava perdendo. Não creio que isso seja um problema. Acho que ele necessita agregar algumas coisas a seu jogo, porém não precisa trocar nada.
Terra - Muitas vezes se critica também a atitude do Bellucci em quadra. Ele vibra pouco e em certas ocasiões é frio. Um pouco da famosa raça argentina não pode ajudar?
Daniel Orsanic - Cada jogador tem sua personalidade. Mas uma verdade é que não há nenhum bom jogador de tênis que não lute, e creio que Bellucci seja um lutador. Ele joga e luta em todos os pontos. Da minha parte, sendo argentino, não penso tanto em mudar sua personalidade e sim em agregar algumas coisas a seu jogo. Gosto de como ele é, não tem que mudar nada.
Terra - Você foi um bom jogador de duplas e obviamente atuava bem junto à rede. O voleio é um desses aspectos que o Bellucci deve melhorar? Atuar em mais torneios de duplas poderia ajudá-lo nesse sentido?
Daniel Orsanic - Creio que esse é um aspecto a trabalhar. Ele já o faz bem e pode melhorar. Vejo as duplas como um bom complemento e ele pode participar, mas a prioridade é para as simples - 100%.
Terra - No Brasil, como você pode imaginar, criou-se uma expectativa muito grande em torno da parceria entre Bellucci e Larri Passos, que não deu o resultado esperado. Você conhece o Larri? O que achou dessa parceria?
Daniel Orsanic - Conheço Larri desde 1997, ano do primeiro título de Guga (Kuerten) em Roland Garros. Eu fiz semifinal de duplas lá nesse ano (ao lado do compatriota Lucas Arnold Ker). Eu respeito muito o Larri, sei que é um técnico muito apaixonado, que sabe muito de tênis. O que acontece é que a relação entre jogador e treinador às vezes funciona e às vezes não. Às vezes o jogador é muito bom e o técnico também e não coincide com o que esperavam. Isso depende de muitas coisas. Imagino que havia uma expectativa muito grande. Os dois não funcionaram como o Brasil queria, porém isso não fala bem nem mal de nenhum dos dois. A relação talvez não tenha dado os frutos que almejava, mas os dois tentaram o melhor.
Terra - Você citou o Guga. O Brasil tem menos tradição no tênis que a Argentina e qualquer jogador que se destaca já é comparado a ele. Acredita que essa pressão seja difícil para o Bellucci suportar? Vocês já conversaram sobre isso?
Daniel Orsanic - Ainda não falei disso nem de outras cosias. Esse período de treinamento (a partir desta semana em um haras de Monte Mor, a 122 km de São Paulo) vai servir para que nos conheçamos bem. Entendo que sempre haja uma referência de cada país. O Guga é uma referência no tênis e quando surge outro jogador bom as pessoas e a imprensa começam a comparar. O Thomaz está fazendo seu próprio caminho como tenista, como pessoa e chegará aonde tem que chegar. Guga conseguiu coisas impressionantes, chegou ao topo do ranking (entre 2000 e 2001) e o Thomaz tem que fazer seu caminho. É um jogador com grandes habilidades que tem de trabalhar com tranquilidade.
Terra - O fato de você morar em Buenos Aires e ele em São Paulo pode atrapalhar? Como será o calendário de treinamentos?
Daniel Orsanic - Sempre é mais fácil viver na mesma cidade e teremos que viajar muito. A primeira semana de treinamento será no Brasil, as três seguintes serão em Buenos Aires, e depois viajamos para Auckland e Melbourne (Bellucci disputará o ATP 250 de Auckland a partir de 9 de janeiro e o Aberto da Austrália a partir do dia 16). Depois começa o giro da América do Sul, com o torneio em São Paulo (Brasil Open, de 13 a 19 de fevereiro). Em algumas semanas vou a São Paulo, em outras ele virá a Buenos Aires. Mas isso se arrumará sem problemas.
Terra - Você será o quarto técnico de Bellucci em cinco anos, depois de Léo Azevedo (em 2008), Zwetsch (2009 e 2010) e Larri (2011). Esse histórico incomoda?
Daniel Orsanic - Não me perturba. Trabalhei cinco anos com o (argentino José) Acasuso (entre 2004 e 2008) e três anos e meio com o Cuevas (entre 2008 e 2011). Espero fazer um bom trabalho com o Thomaz que possa perdurar, mas não penso nisso. Penso no inicio, em nos conhecermos bem, em poder ajudar a ele jogar o seu melhor tênis.
Terra - O acordo é válido por um ano?
Daniel Orsanic - Em princípio sim. Há um período de testes, como em todas as novas relações. O treinador e o jogador têm de se sentirem cômodos.
Terra - Como você compara o Bellucci com os outros tenistas que você treinou?
Daniel Orsanic - Cada jogador é diferente. O Acasuso conseguiu por sorte o melhor ranking da carreira, chegou ao número 20 enquanto estávamos juntos (em 2006), ganhando dois ATPs (Bucareste 2004 e Viña del Mar 2006) e fazendo final da Copa Davis como protagonista (disputou a decisão de 2006, contra a Rússia, e a de 2008, contra a Espanha, sendo derrotado em ambas). Ele conseguiu muitas coisas lindas, e isso me deu muita satisfação. O Cuevas também conseguiu o melhor ranking (45º colocado em 2009). Com o Thomaz, o objetivo no longo prazo é que ele tenha a melhor temporada (da carreira). Em curto prazo é nos conhecermos melhor.
A melhor temporada da carreira do brasileiro foi a de 2010, a qual encerrou como o número 31 do planeta. Em 2009 havia terminado como o 36.
Terra - O Bellucci teve um segundo semestre ruim em 2011 e defenderá muitos pontos no ranking (82,5% do total) até 11 de junho. Você projeta uma pressão maior no início de 2012?
Daniel Orsanic - O bom é que terá toda a segunda metade do ano para somar (ri). Na primeira metade (de 2011) ele jogou bem e conseguiu muito pontos. Mas tem de ir com tranquilidade, ir somando, construindo o ano do princípio ao fim.
Terra - Você não tem uma meta de atingir um posicionamento específico no ranking com o brasileiro?
Daniel Orsanic - Na verdade nunca fiz isso e não vou fazer.
Terra - Mas você está bastante motivado para que ele tenha a melhor temporada da carreira, não é? Conversei com sua mãe, e ela me disse que você está muito feliz.
Daniel Orsanic - Estou muito motivado. O Thomaz é um jogador muito interessante não só em nível sul-americano como também em nível mundial.
DICAS PARA PROFISSIONAIS:
TÊNIS CAMPEÃO: 200 EXERCÍCIOS DESCRITOS EM VÍDEOS PARA TREINO
Manual para Professor de Tênis de Quadra
Nenhum comentário